Dança no espaço urbano traz reflexão sobre pontos mais visitados de Brasília

Por meio da arte, turistas e moradores entram em contato com o inusitado e passam a ter novo olhar sobre a cidade 

Nos últimos anos, artistas têm se apresentado em espaços urbanos para mostrar às pessoas diferentes modos de enxergar a cidade. O Festival Internacional de Dança em Espaço Urbano – MarcoZero, por exemplo, traz para turistas e moradores de Brasília a possibilidade de imersão do público com a dança em pontos mais frequentados da cidade. Por meio de intervenções artísticas, coreógrafos e dançarinos trocam experiências com o inusitado e com um público diversificado. Na última edição, realizada de 26 a 30 de abril, artistas brasilienses discutiram a importância da arte na capital que é berço da política no Brasil.

Para o diretor do CEDA-SI (Coletivo de Estudos em Dança, Educação Somática e Improvisação), Diego Pizarro, as pessoas estão sempre compondo o espaço pelas escolhas que fazem, selecionando movimentos e gestos no dia a dia. “No deslocamento da nossa casa para o trabalho, a composição já faz parte da vida urbana. É extremamente rico a gente fazer essas propostas de imersão, pois a dança no espaço público promove discussões”, explica. O coletivo se apresentou na Praça dos Três Poderes com a performance CorpOásis.

A artista independente Poema Mühlenberg faz parte da companhia Nós no Bambu e sua experiência com o espaço urbano se dá pela técnica acrobática em esculturas artesanais de bambu. Ao apresentar a performance CaPoesia na Torre de TV, a dançarina destacou as condições e diferenciações da arte na paisagem urbana. “O espaço urbano tem variáveis que o artista não controla: a luz, o tempo, o vento e o público. A experiência é muito rica, eu amadureço a performance por causa desses desafios”. Para Poema, é muito válido levar a expressão artística para a rua para que a população da cidade ou turistas que estão passando possam enxergar o espaço de outra forma.

Em um vagão de metrô, as dançarinas Olivia Orthof, integrante do coletivo CoisAzul, e Laryssa Teles, da companhia Mirabolantes, apresentaram a Ação Guerrilha (Pole)mica, uma performance de pole dance. Esse tipo de intervenção gera reflexão tanto para o artista, quanto para o público que entrou na condução apenas com a intenção de se locomover. “Há mais de dois anos eu venho experimentando espaços inusitados para me apresentar. Rodoviária, embaixo de viadutos, Esplanada e Conic. Acredito que isso deixa a dança acessível para pessoas que não têm dinheiro para entrar em um teatro, por exemplo”, conta Olivia.


Laryssa Teles explica que é preciso realizar visitas técnicas no espaço anteriormente. No caso da apresentação no metrô, foi preciso medir a altura do poste (barra de aço) e o espaço que elas poderiam utilizar. “Nós realizamos vários ensaios com base nessa visita para saber qual coreografia se adequaria para aquele espaço”, conta a coreógrafa.

O artista se realiza quando está em cena. Para Diego Pizarro, quando as pessoas são expostas a uma atividade artística no local em que elas transitam algo importante acontece. “Há uma capacidade forte de formação de público. Em Brasília, é difícil ter um grande público que vai a um local assistir dança”. Além disso, o artista brasiliense é carente de espaços culturais. “O Teatro Nacional está fechado e o Centro de Dança está em reforma há mil anos”, reclama Olivia.

Para Olivia Orthof, as apresentações nas paisagens urbanas dão acesso para outro tipo de público. A diferença entre palco e a rua é que, no palco, o artista está mais protegido e na rua se tem um resultado – negativo ou positivo – mais imediato da opinião do público a respeito da apresentação. Para a dançarina Victória Oliveira a interação é essencial. “Quando a gente está na rua e se coloca em posição de escuta, se sensibiliza, logo produzimos reflexões acerca do espaço e nos permitimos fazer mais”.

A burocratização da intervenção dos artistas no espaço público dificulta a perpetuação da identidade cultural que a cidade possui. Para Marcia Regina, atriz e dançarina da Companhia Anti Status Quo, Brasília é uma cidade muito institucional. “Não se pode fazer muita coisa. Para se fazer alguma coisa tem que pedir uma autorização por meio de um ofício. Quem é o dono do espaço? Até quando esse alguém está ali para promover a segurança do espaço? A gente tem tido muita dificuldade de ocupar os espaços urbanos porque não é permitido”.

Danças populares e tradicionais

A dança tem a necessidade de ser exposta, porque é uma manifestação de ideias do homem por meio do corpo. O coreógrafo Jonas Sales, professor do Departamento de Artes Cênicas da Universidade de Brasília, acredita que as pessoas colocam as danças tradicionais (como forró, frevo, funk e dança de rua – street dance) como folclore. “Muitas pessoas não percebem que essas danças têm o poder de intervenção dentro do espaço urbano e é o reflexo dos desejos do povo”.

Para o professor, por mais que Brasília seja uma cidade segmentada e setorial, é perceptível que diversos grupos fazem movimentos e buscam quebrar rótulos tentando chegar à grande população para mostrar sua arte. “As danças tradicionais nada mais são do que a dança gerida pelo povo, querendo ganhar espaços. Muitas pessoas colocam como algo velho o que na verdade é muito atual”. A dança no espaço urbano não manifesta apenas o desejo do artista, mas também o desejo de toda uma sociedade.

Por Gabrielly Pimentel.

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