A crise dos meninos

 

Marco Antonio Spinelli*

Durante muito tempo em nossa História, as mulheres foram vistas como pessoas de segunda classe. Foi longa e dolorosa (e ainda é) a luta para votar, estudar e trabalhar em condições minimamente igualitárias às dos homens. Hoje em dia, após várias ondas de Feminismo, as mulheres estão se desempenhando melhor que os homens nas escolas, faculdades e na sensação de bem estar pessoal. Em muitos grupos.

Estatísticas americanas estudam muito de perto o Suicídio como uma patologia em si, ligada mais ou menos a várias doenças psiquiátricas. Uma lente de aumento está sendo colocada em meninas pré-adolescentes, que estão sofrendo mais com uma doença agravada muitíssimo pelas Redes Sociais, que é a Comparação, mas não é sobre isso que esse artigo vai falar. Vamos falar sobre os rapazes.

Os riscos suicidas, nesses estudos, andam equiparados em adolescentes, e isso muda radicalmente quando falamos sobre adultos jovens: o risco aumenta quase seis vezes para os rapazes (em relação às garotas). Os índices de mal desempenho na faculdade e fracasso profissional também está aumentando entre eles. As escolas estão abraçando uma pedagogia centrada em sentimentos, avessa a riscos e a competição, com uma velada e pouco consciente campanha contra valores caros ao Masculino e seus ritos de iniciação. Vou contar um caso que ilustra o assunto: um dos meus filhos, na época do Ensino Fundamental, tinha um talento razoável para o Xadrez. Uma vez ganhou um pequeno torneio, com meninos de outra escola. Não ganhou medalhas, nem mesmo um diploma alusivo à vitória. Tudo para não desestimular os outros competidores (competidores?), que não chegaram às finais do torneio. Fui até uma loja de esportes e comprei um pequeno troféu meio brega, entreguei para meu filho e gritei: É campeão! Diante do olhar meio atônito das professoras. Gritei “É campeão” algumas vezes. Um autêntico Macho Tóxico, não?

Sinto muito, queridas e queridos: competição é importante, perder é difícil, mas muitas, muitas vezes mais engrandecedor do que ganhar. A derrota sempre te lança para a reflexão, e a reflexão proporciona aprimoramento. Além da tolerância à frustração.

Hoje chegam no mercado de trabalho essa geração criada nesse ambiente meio anti-masculino. Essa geração está sendo chamada de Floco de Neve. Eu usaria um termo mais tupiniquim, que é a Geração Paçoca: basta um peteleco para tudo se desmanchar. Terminou um namoro? Tomou um fora? Corre para o psiquiatra medicar. Um cliente querido veio relatar que seu filho, que parecia um Buda de tranquilidade, estava de cama há alguns dias porque tomou um fora da namoradinha. Chora na cama e não quer voltar para a escola, onde a visão da garota com outro cara é insuportável. Quer mudar de escola. Não dorme direito nem come. Deve marcar consulta e ser medicado? Pelo amor de Deus, não! O primeiro pé-na-bunda a gente nunca esquece. É duro, é difícil, mas levanta o queixo e vai para a aula, rapaz.

A Geração Paçoca está sofrendo com essa política coletiva de investimento na fragilização das crianças: nada pode afetar a sua autoestima. Os meninos estão sofrendo dentro desse contexto. As meninas precisam ser Empoderadas (detesto esse termo). Os meninos precisam evitar ser um Macho Tóxico ou um Hetero Top. As Redes Sociais explodem de vídeos contra os Narcisistas e os Namorados Abusivos.

Espera aí. Esse texto é um libelo contra o Feminismo e os direitos das mulheres de serem respeitadas, valorizadas e protegidas contra abusos, avanços sexuais inadequados e machismos de todos os tipos? Obviamente que não! O que esse artigo tenta destacar, como outros que já escrevi, é que estamos numa era de extremos, e os extremos sempre levam ao adoecimento. O tema, o foco aqui, é o adoecimento dos rapazes. A culpabilização do Masculino e de seus valores. Ser Masculino não significa ser um Macho Tóxico. Competir, correr riscos, vencer, fracassar, são valores importantes para meninos e meninas.

Na Era dos Extremos, que estamos vivendo, estamos emparedados entre a cultura da Ultradireita tacanha, machista, tóxica, de um lado, e a Cultura Woke, do outro lado, caçando pessoas, lacrando e cancelando os caras da “Direita fascista”. Com aquele ar santarrão dos ditos Progressistas. Parece tola e infrutífera a tentativa de se encontrar o caminho do Meio e o equilíbrio fundamental entre Masculino e Feminino que nossa Psique, nossa Sociedade, nosso Planeta, tanto necessitam. Particularmente, a disputa desses extremos está deixando nossos meninos sem saída. É bom voltar nosso olhar para eles. Antes que seja tarde.

 

*Marco Antonio Spinelli é médico, com mestrado em psiquiatria pela Universidade São Paulo, psicoterapeuta de orientação junguiana e autor do livro “Stress o coelho de Alice tem sempre muita pressa”


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